Monday, August 27, 2007

A Medula da Alma

Para poder encontrar-me a mim mesmo, tive primeiro de me perder. Tive de chegar ao pleno vazio de mim. Não foi um vazio imóvel, um compasso de espera na dança do ser: o meu vazio foi um rodopiar imparável de dinâmica negativa, de tal forma que desistir surgiu, por fim, como premente solução lógica para acabar de vez com o tormento daquele excesso giratório. Tinha dezanove anos. A minha vida, para todos os efeitos, mal começara. Mas antes mesmo de ter podido pisar-lhe o palco, parecia ter chegado já o momento de fechar o pano. A tragédia grega ensina que "o amor não deve atingir a própria medula da alma". Mas na vida e alguns de nós, de preferência uma única e irrepetível vez, a medula da alma é atingida pelo amor. Felizes os que sobrevivem.

Frederico Lourenço, A Formosa Pintura do Mundo

1 Comments:

Blogger Paulo Dias said...

não podia estar mais de acordo com este texto. Incrivelmente, ele depilou-me e definiu-me de uma forma assustadora. Quero ser e deixar de ser este texto para voltar a ser. Obrigado por o teres dado a conhecer. Beijo grande.

06:05  

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